My love is mine - Vânia e Rory

 


 Rory Lee-Smith é trouxa! Essa frase funciona bem com nosso protagonista. Legal, né? Rory é gênero fluído, afro-canadense e apaixonado por biologia. Além de praticar vôlei, nosso prota gosta muito, é totalmente apaixonado, de Vânia Evenghard, vulgo sua alma gêmea: Uma garota com cabelo longo, ondulado e ruivo, sardas, olhos castanho-esverdeados e a personalidade mais amável do mundo. Claro, ele não acredita em amor à primeira vista ou em amor fácil e rápido.

 A teoria dele é que seu coração sempre prestou atenção na maravilhosidade que Vânia é e foi se cativando ao longo dos anos em que estudam juntos no ensino médio e no mesmo curso da mesma faculdade. O de cachos escuros sempre nutriu sentimentos e esperanças em relação aquela garota atenciosa e incrível, mas nunca teve coragem para se aproximar dela.

 Agora Rory lida com as consequências de seu medo. A faculdade já acabou e por mais que elas tenham o mesmo grupo de amigos e se encontrem ocasionalmente, via a Evenghard se afastar cada vez mais. Ela estava fazendo graduação pra ser botânica, o que ocupava seu tempo com estudos e trabalhos que exigiam mais ainda sua atenção e dedicação.

 Raphael, um indígena nativo-americano, vendo o sofrimento da amiga, decidiu encorajá-la a chamar a ruiva para sair. Lógico que ela, Vanny (como a chama), toparia, já que era uma oportunidade de tomar um ar fresco e se distrair das mil e uma responsabilidades que tinha adquirido graças a graduação para realizar seu maior sonho desde o fundamental.

 Imagine só admirar alguém de longe por anos, sempre guardar em seu coração um espaço para aquela pessoa e então você decide tomar uma atitude sobre isso. E o motivo de seus sentimentos existirem concorda como se esperasse por isso há milhares de anos, há centenas de outras vidas. Rory achou estranho pra caralho.

 Ambas marcaram de sair numa quinta à noite para jantar num restaurante vegetariano, por respeito a Lee-Smith (por motivos óbvios), e depois ir para a casa da Evenghard ver um filme de ficção-científica. Parecia tudo perfeito. 

 Ele foi buscar Vânia no apartamento dela, se surpreendendo ao vê-la usando um vestido verde-escuro colado no corpo esbelto, os cabelos definidos, os lábios marcados por um batom vinho e um delineador realçando os olhos e a profundidade deles. Ficou de queixo caído.


一 O que foi? 一 Perguntou com um sorrisinho sedutor.


 Rory obrigou-se a fechar a boca.


一 Nada! Você está muito bonita. 一 Gaguejou, meio afobado pela visão divina que tivera.


一 Obrigada. 


 Ela entrou no carro e ele deu partida.


一 Quais são seus pronomes hoje? 一 A Evenghard quis saber.


 Não se surpreendeu com isso, a ruiva sempre perguntava por respeito e educação.


一 Sou ele/dele agora, não sei se isso perdurará por todo o encontro.


 Ela assentiu, como se entendesse. A maioria das pessoas achava estranho, mas não Vânia. Nunca ouviu um "a" sobre sua sexualidade vindo dela e nunca viu nenhuma careta ou expressão que indicasse estranheza. Com ela, nunca se sentia um estranho no próprio corpo.

 O encontro ocorreu normalmente. O jantar estava uma delícia e a conversa se desenrolou com naturalidade, durando até mesmo entre as garfadas e bebericadas de suco.

 Houveram vários momentos em que Rory se questionou o motivo de tanto medo em relação a possibilidade de um encontro com Vanny, já que, agora que estava efetivamente tendo o tão temido encontro, não tinha nenhuma justificativa para ter esperado tanto por aquilo.

 Depois do jantar, ambos foram para o apartamento da Evenghard. Colocaram uma música no rádio e cantaram juntos a melodia animada que não conheciam, o que gerou erros na cantoria e muita risada deles. A noite caia lentamente sobre a cidade, os postes de luz se acendendo a medida que ficava mais escuro e essa luz se fazia necessária.

 Era uma noite bonita, o Lee-Smith admitia. E, ao lado de Vânia, a noite se tornava mais bela ainda. Não conseguia entender que, mesmo depois de tanto tempo, parecia que só a amava mais do na época da adolescência e de quando era jovem-adulto. Sentia ainda mais devoção por aquela mulher e pelo que ela se tornara com aqueles anos. Bela, inteligente, audaciosa.

 Ao contrário dele, ela não sentia medo da ideia de ter um encontro. Ao contrário dele, ela estava fazendo graduação para atingir seu objetivo principal. Ao contrário dele, ela só ficava ainda mais bonita e vivaz. Ao contrário dele, ela sempre fora o ser mais perfeito do mundo e a alma mais gentil que já tivera o prazer de conhecer. Mas não se sentia mal. A ruiva não tinha culpa de ser esbelta e maravilhosa, assim como o próprio Rory não tinha culpa por ser "menos" que ela. Na verdade, se via como um bom partido romântico.

 Quando finalmente chegaram no prédio dela, deixaram o carro na garagem e pegaram o elevador. Logo alcançaram o andar que ela mora, indo para a porta que pertencia a sua residência. Vânia entrou em sua casa já se livrando dos saltos pretos e os jogando em algum canto. Ela soltou ao cabelos, ajeitando-os com os dedos.

 Convidou-o a entrar e disse que ficasse a vontade. E o fez. O lugar era aconchegante. Cheirava a café e plantas naturalmente aromáticas. Observou-a ir até a cozinha, abrindo um dos armários de madeira clara e pegando de lá uma garrafa e duas taças bonitas.

 Rory se acomodou no sofá, olhando para o rack da sala, onde só repousavam livros, revistas e cadernos de anotação. Nenhum eletrônico ali. A Evenghard colocou uma música pra tocar e serviu ambas as taças com vinho, bebendo um gole em seguida.


一 Onde está a TV? 一 Perguntou de forma inocente e ela sorriu, sedutora.


 Porra! Aquele sorriso seria sua perdição.


一 Fica no meu quarto. Uso a sala mais pra estudar e beber enquanto faço isso.


一 Estes são seus estudos?


一 Alguns livros são de leitura mesmo. Uns romances e um pouco de ficção. É um bom passa-tempo.


 Não duvidava.

 A música de fundo parecia antiga e a letra era romântica. Identificou-a depois de dois segundos a ouvindo com mais atenção. Put your head on my shoulders, do Paul Anka. Adorava aquela música pela vibe tranquila e sonhadora que transmitia. Bebericou o vinho, gostando do sabor mais do que esperava gostar.


一 Por que me chamou pra sair? 一 A ruiva quis saber.


 Rory sentiu toda a tranquilidade esvair de seu corpo quando a pergunta foi pronunciada. O que responderia a ela agora?


一 Eu...


一 Seja sincero, por favor. Não há por quê esconder sua verdadeira motivação a essa altura.


 Suspirou, tentando superar o nervosismo e achar as palavras certas para expôr a verdade.


一 Eu... 一 Um bolo se formou em sua garganta. 一 Merda...!


 Vânia indicou que ele bebesse mais um gole e o fez. Não melhorou muito, mas o suficiente.


一 Eu gosto de você há... muito, muito tempo, mas nunca tive coragem de tomar uma atitude em relação a isso até... bem, hoje.


 A satisfação no rosto dela foi difícil de assimilar, mas não houve espaço para questionamentos porque logo ela se pôs a falar.


一 Sabe por que eu aceitei?


 Negou com a cabeça.


一 Porque eu também gosto de você há tanto tempo quanto, mas deixei que você ditasse o ritmo que nosso relacionamento teria. Por que você acha que nunca namorei alguém, mesmo na faculdade? Porque nunca houve ninguém que eu quisesse mais do que você, Leslie.


 Ouvir seu verdadeiro nome soar da boca perfeita daquela mulher ainda mais perfeita fez um arrepio percorrer sua espinha. Puta que pariu...


一 Por que esperou tanto?


 Ela sorriu, como se a resposta fosse simples.


一 Porque valia a pena. Você sempre valeu a pena. Mas eu nunca mudei quem sou pra ser vista por você e nem para ser desejada. Eu sempre fui quem eu quis ser e agi da maneira que eu sempre achei melhor agir. Eu não dependo de você pra viver e nem você depende de mim. Amar você é uma escolha que eu fiz, assim como esperar. E não me arrependo.


 A sinceridade naquela declaração foi suficiente para fazer Rory se sentir a pessoa mais amada do mundo e a mais sortuda do universo. Como ela poderia formar uma frase que fosse tão profunda e maravilhosa quanto aquele discurso?


一 Porra... Eu sou tão feliz por ter você. Sou a porra de uma sortuda. Ganhei na loteria do universo. Você tem ideia? Eu te amei por tanto tempo e com tanto medo de ser algo da minha cabecinha maluca que continuei longe, evitando a possibilidade de dar o primeiro passo. Que burra eu fui.


一 Confesso que eu mesma teria te chamado na próxima semana se você não tivesse me telefonado. Eu esperei, mas paciência tem limite, sabia?


 Ambas riram. A música recomeçou e as primeiras frases foram ouvidas pelas duas. Vânia se aproximou, roçando seus lábios ainda vermelho-vinhos nos da outra com uma sensualidade que a Lee-Smith achava fora do comum. Beijaram-se longamente. Nesse momento, anjos deram vivas, todos os seres celestes comemoraram e explodiram fogos em um festejo.

 O beijo virou outro com uma intensidade causada pelo anseio reprimido. Todos os anos de paixão solitária foram compensados nos toques suaves e veementes que elas trocavam. Rory sentia-se em êxtase pela realização que aquela sensação lhe trazia. Finalmente era correspondida e se sentia nas nuvens por isso.

 A Evenghard parou por um momento, olhando intensamente para a amada.


一 Quais são seus pronomes agora?


一 Ela/dela. Por que?


 Ela sorriu, maliciosa.


一 Preciso saber como devo te tratar enquanto gemo sob seu corpo.


 Um arrepio lhe subiu a coluna. Naquele momento, nunca teve tanta certeza de que aquela mulher lhe pertencia por completo. E Rory pertencia a ela da mesma maneira.



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