NTL -- Programa à Quatro (XVII)

 


 Nico considerava a si mesmo uma pessoa reservada e antissocial por opção própria desde que se entendia por gente. Nunca imaginou que fosse quebrar sua principal conduta: Não vá à festas, não importe o que digam. Bem, essa conduta só pode ter sido quebrada se a parada LGBT puder ser considerada uma festa.

 Pois bem, é o mês do orgulho e nosso pequeno ômega não ficou de fora. Jason, Percy, Frank, Leo e, principalmente, Will o acompanharam e se divertiram tanto quanto ele. Se sentia feliz por ter ido. Satisfeito consigo mesmo por não ter vergonha de ser e mostrar para os outros o que realmente é. Mesmo que algumas pessoas não aceitassem isso.

 O moreno estava na companhia do Grace e de seu amigo, Leo, assistindo a um filme junto com eles. Como se fosse a primeira vez é um filme legal ao qual Nico não se cansa de ver e rever, mas o ômega latino não parecia achar a mesma coisa. Estava de cara emburrada o tempo todo, fazendo pouco caso do filme nas primeiras oportunidades.

 Nico olhou preocupado em sua direção. Sabia muito bem o motivo de tanta birra. Tinha brigado com Frank. Pois bem... Leo vinha conversando com o Zhang fazia algum tempo, mas começaram a ficar casualmente quando saíam juntos. Apesar de gostarem muito um do outro, não assumiram nada oficialmente. E esse era o problema: Valdez queria algo mais serio e não tinha certeza de nada em relação aos sentimentos do alfa. Isso o irritava.

 Jason observava as manhas nada convencionais do ômega sem entender, completamente por fora dos problemas amorosos do amigo. Dividia o olhar entre o garoto e o primo, esperando que, ao analisar bem ambos os lados, a compreensão viesse ao seu encontro. Adivinha? Não estava funcionando.

 Talvez estivesse louco e imaginando coisas aonde não haviam, mas... E se não fosse impressão sua que Frank estava mais do que apenas interessado em Leo? O Grace e o alfa em questão foram amigos de classe na escola até o Zhang se mudar de volta para o Canadá e deixar tudo para trás no fim do ensino médio.

 Revê-lo depois de tantos anos foi muito bom. Deixou-o a parte de tudo o que tinha perdido indo embora e contou as "novidades" acumuladas por anos. Despejar todas aquelas informações sobre o sino-canadense não deve ter sido uma de suas escolhas mais inteligentes, pois esquecera de contar sobre o ômega latino e acabou por surpreendê-lo, se é que ainda era possível.

 Agora era possível, ainda estava avaliando a possibilidade, de seu amigo ter se apaixonado por um indivíduo indomável, porém muito decente em geral, que não sabia se corresponderia na mesma intensidade os seus sentimentos.

 Jason, apesar de saber tudo isso, não sabia como contar para Nico sem fazê-lo surtar. Talvez outra hora. No momento, sua prioridade era reunir coragem para... uma outra parada ali... (Me digam que entenderam a referência. Pelo amor dos deuses!)

 Pausou o filme, fazendo com que as órbitas negras como safiras brutas o encarassem enigmaticamente. Já sabia o que aquilo significava. Quase conseguia ouvi-lo dizer: "O que diabos você está fazendo agora?" Lançou-lhe um sorriso amarelo e murmurou algo como "Volto logo" para apaziguar sua expressão antes de se mandar para o banheiro com urgência.

 Ao chegar no cômodo, fechou a porta e suspirou. Seus ombros caíram e ele passou a mão no rosto, sem saber o que fazer. Na verdade, sabia, mas não como prosseguir. Era algo tão besta e não tinha a menor ideia de como falar. Nico o mataria se fizesse tanto alarde por causa de um pedido estúpido.

 Suspirou, insatisfeito. Era algo tão simples de se fazer e estava tão nervoso quanto na formatura da faculdade. Necessidade? Nenhuma. Necessidade zero. Pra quê tanto drama para fazer uma pergunta? Uma.

 Saiu do banheiro às pressas, determinado. Sentou ao lado do primo e desligou a TV. Ouviu ambos os ômegas reclamarem, entretanto, ignorou-os solenemente. Respirou fundo, idealizou o que iria dizer e se forçou a pôr as palavras para fora. Como dizia seu pai: Fale pra fora, criatura! 


一 Nico, que tal a gente passar o dia dos namorados junto?


 A confusão chegou à sua expressão. Seu rosto pálido ficou ainda mais confuso ao analisar cada uma das letras pronunciadas pelo loiro. Passar o que?


一 Como assim?


一 Eu chamar o Percy e você o Will pra fazermos um programinha pro dia dos namorados, nós quatro. 一 Explicou, nervoso. 一 Entendeu?


 As sobrancelhas de Di Angelo se ergueram em compreensão. 


一 Ata! 一 Riu ele. 


Foi a vez de Jason ergue-lhe uma sobrancelha, questionador.


一 O que foi que você pensou?


一 Merda, Grace, merda. Eu pensei merda.


 O alfa corou, mas sorriu junto.


一 Mas então... 一 Hesitou. 一 Você topa?


一 Claro que sim! 一 Sorriu ainda mais, as rugas no canto dos olhos se fazendo presente. 一 Como poderia perder um programa romântico com meu namorado e você, Super-Homem do Paraguaí.


 Jason teria se sentido aliviado se não tivesse ficado tão ofendido.


一 Nico!


一 O que foi? 一 Zombou. 一 Prefere Garoto Relâmpago?


 E foi assim que começou uma leve briga entre eles, com Leo ao lado, comendo a pipoca e religando a TV, ignorando calmamente os primos birrentos discutindo ali.






☀  ✲  ☀






 Os pedidos chegaram em pouquíssimo tempo, mas não atrapalhou em nada o grupo animado que conversava tão calorosamente. Recontavam histórias de suas próprias infâncias e comemorações anteriores naquela mesma data, curtindo a comida e aproveitando o momento de paz enquanto podiam.

 Nico saboreava sua macarronada, com Will roubando algumas garfadas de seu prato, alegando que o dele era mais gostoso justamente pela pessoa que estava degustando. Brega? Não. Foi até original! Além disso, o moreno gostava de dividir as coisas com Solace, sejam roupas, pratos, comida e até o mesmo ar, se é que me entendem.

 Jason estava relatando alguma coisa sobre sua adolescência, gesticulando fervorosamente com uma batata frita e dando tapinhas amigáveis na mão sorrateira de Percy, que tentava, a todo custo, roubar algumas de uma embalagem do McDonald's perto do loiro em questão vez ou outra.

 O estudante de Biologia Marinha parecia frustrado. Suspirou e se recompôs em pouco tempo, pedindo refil das fritas para um atendente que passava. Di Angelo ouvia atentamente, não se importando com William pegando seu prato pra ele. Se fosse pelo menor, ele podia comer sem problemas.

 Era uma tarde bastante agradável. O sol invadia as janelas e esquentava tudo o que seus raios tocavam, mais ou menos como Will. A brisa leve tornava o calor suportável e varria as folhas secas pelas ruas. As lanchonetes jogavam impregnavam o ar com o cheiro de suas mercadorias frescas, atraindo muitos famintos desavisados.

 O moreno sentia uma plena paz por dentro. Seus ombros estavam colados com o bíceps de Will, seus feromônios estavam na mesma intensidade que os dele, seus dedos entrelaçados com os deles, seu coração batendo no mesmo ritmo que o dele. Ao lado do alfa, se sentia completo. Se sentia em paz infinita, apenas porque ele estava ali, ao seu alcance e pleno dispor.

 Fechou os olhos devagar, esquecendo-se da história de Jason por um momento. Encostou sua cabeça no loiro e suspirou, apertando ainda mais sua palma contra a dele. Will correspondeu, olhando intensamente. A sensação que os envolvia era tão infindavelmente confortável e harmônica que nada mais importava.

 Até que o som levemente irritante de notificação quebrou essa bolha, causando um certo desconforto ao ômega por ter chamado atenção de todos na mesa, visto que o volumo havia sido consideravelmente alto. Pegou o celular no bolso, desconcertado. Jurava que tinha desligado essa merda, pensou consigo mesmo.

 Se arrependeu de ter chamado o aparelho de merda no mesmo instante que visualizou quem era o remetente*. Bianca.




Bibia: Nico!

Como está sendo o seu dia dos namorados?

Tô aqui com Thalia no apê dela.

Conta logo como você tá!!!

Responde quando der

Beijinhos!!!


Você: Oi Bia

Estou bem e vc?

Estou com Jason, Percy e Will no McDonald's

Vê se cria juízo

Sozinha com Thalia?!?


Bibia: Igi

Parecendo a mamãe

Eu ein!

Obvio que tenho juízo, né

Não sou eu que praticamente devoro minha alfa com os olhos todo santo dia!



Você: Isso não é argumento, Bia

Não sou eu que perdi minha virgindade com meu alfa

Rum!



Bibia: Apelar pro lado sexual não vale!


Você: Mas foi você que começou

Doida!


Bibia: Doido!




 Nico riu com a pequena discussão que tinha ganhado. Bianca, apesar de negar, não tinha muito juízo. Mesmo assim, o menor ama sua irmã, independentemente da escolha que ela tome para sua vida. Independentemente do que viesse acontecer.

 De repente, uma pequena ideia surgiu em sua mente. Apertou o botão ligar e apoiou o celular em um porta-guardanapo, na horizontal. Percy e Jason o olharam com curiosidade, mas Will sorriu, sendo o único que sabia que estava conversando com Bianca há segundos atrás e entendendo o que estava fazendo.


一 Alô?


一 Alô, Bia. Feliz dia dos namorados!


 Nico sorria, feliz. Thalia beijou a bochecha da morena e cumprimentou todo mundo. O grupo não demorou nem dois segundos para começarem a conversar, animados. Di Angelo voltou ao seu estado de paz, trocando ideia com o primo, beijando casualmente o namorado, zoando com Percy e conversando calorosamente com a irmã.

 Seu dia dos namorados não poderia ser mais perfeito. Na companhia das pessoas que mais amava no mundo.






C O N T I N U A






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