Will o buscou de carro na porta do cemitério após o enterro, a pedido do próprio Nico. Depois de entrar no veículo, tudo o que conseguiu fazer foi encostar a cabeça no vidro levantado e observar a paisagem a medida que o loiro dirigia, sem realmente prestar atenção no que se passava pelo lado externo.
Encontrava-se em uma bolha. Bolha essa que não sabia como sair. Simplesmente não conseguia controlar todos os sentimentos que a recente morte de sua mãe lhe causa.
Tentava, e muito, continuar firme, como Bianca vinha fazendo, mas é impossível. Como você lidaria com a perda de uma pessoa tão importante?
Acima de tudo, se sentia culpado. Culpado por absolutamente tudo o que se pudesse imaginar. Sua capacidade de se distrair estava fora do seu alcance, quando mais precisava dela. Tudo o que fazia para afastar a mágoa simplesmente não funcionava. Nico passou horas dentro do carro, tentando se distrair.
Cantarolava, pensava em um livro que queria comprar, nos filmes que iria assistir com Jason, nos lugares que queria visitar com Piper e Leo quando voltasse a ter a mesma energia de antes, mas... Parecia que tudo era em vão. Pensava nas decisões que queria tomar para sua vida, em tudo o que tinha o desejo de fazer ao lado de Will... Sua mente, porém, sempre voltava a focar na dor. Cada vez maior e mais intensa.
Tentando, desesperadamente, focar em outra coisa, procurou algo que o interessasse na paisagem. Folhas e mais folhas. Outono maravilhoso, né? Nada realmente legal lá fora. O ômega estava quase sucumbindo à lástima quando um choque percorreu seu braço. Ao olhar, tinham parado em um sinal vermelho e Will pegou sua mão na dele.
一 Eu sei que dói 一 Iniciou ele, a voz embargada, mas em tom doce 一 Perder quem quer que seja que for minimamente importante machuca muito mais do que se imagina... Mas não é o fim do mundo. Apenas parece o fim.
Por algum motivo, acreditava nele. Solace tinha passado pela mesma dor que estava passando agora. Sabia exatamente o que estava sentindo e estava se esforçando para amenizá-la. Era engraçado, de certa forma, como o garoto parecia ter como missão de vida fazê-lo feliz. Sempre sabendo um jeito de animá-lo.
Apenas apertou a mão do loiro de volta, encarando a sua entrelaçada com a dele. Um simples toque, qualquer que fosse, fazia seu coração bater de uma forma diferente, mais satisfeita, como se estivesse completo. Não sabia bem o que isso significava, mas era uma sensação tão boa que nem queria estragar pensando demais.
一 Obrigado, Will... 一 Murmurou pela milésima vez desde a notícia.
O alfa não se importava e nem conseguia imaginar quantas vezes mais Nico iria lhe agradecer, só queria ficar ali com ele. Quanto mais perto, melhor. Ele precisava de si, queria um ombro pra chorar. Não ligava quantas vezes ele fosse se lamentar, contanto que não afundasse em suas angustias outra vez.
De repente, o sinal ficou verde e um carro buzinou atrás deles, forçando Solace a cortar o contato físico com o moreno para conseguir dirigir e o levar para sua casa, junto de Jason, que os esperava. Devia estar preocupado e ansioso. Ele mesmo queria ter comparecido no enterro, mas acabou não sendo convidado.
Quase fez Nico prometer que lhe contaria tudo, de tão nervoso que estava, mas não executou a ação por vê-lo tão mórbido. Não iria cair bem pedir algo assim. Ele lhe contaria por vontade própria, se quisesse, obviamente.
Foi quando já estavam dois quarteirões de distância do prédio que o ômega segurou seu bíceps, chamando sua atenção.
一 Podemos ir para o seu apartamento? Não quero encarar Jason agora.
一 Claro, mi vida. O que você quiser 一 Respondeu-lhe já fazendo o desvio.
O por quê disso? Nem Will entendeu direito, apenas fez. Se ele estava lhe pedindo de forma tão... acanhada e se justificando, por que não? Não demoraria tanto para chegarem, embora a relativa lonjura de um prédio ao outro. Só esperava que ele ficasse bem, considerando o fato de que estava nas nuvens o tempo todo, essas sendo de tempestade.
☀ ✲ ☀
一 Quer me contar o que está pensando? 一 Questionou-lhe o loiro, se sentando ao seu lado.
Nico virou o olhar para o lado oposto, sem muita vontade de contar. Estivera pensativo desde que tinham chegado ao apartamento de Solace. Mesmo durante o banho que lhe foi proporcionado, deixou a água escorrer enquanto se martirizava. Sabia que seu namorado estava apenas preocupado e... dividir suas lamúrias com alguém poderia ajudar.
O moreno soprou o conteúdo da caneca quente entre suas mãos, chá calmante oferecido por Will, e procurou as palavras certas para tentar expressar o que sentia de um jeito que ele também pudesse compreender seu raciocínio.
一 Na minha infância, meu pai ditava muito o que eu e minha irmã deveríamos ser e fazer em nosso cotidiano 一 Começou, sem saber ao certo se tinha dito da maneira que queria, mas já era tarde pra repor essas palavras em sua boca 一 Minha mãe era a única que parecia discordar do método de educação dele. A única que valorizava mais o nosso bem-estar do que etiqueta e códigos, se é que me entende.
Will assentiu e apertou uma de suas mãos, lhe incentivando a pôr tudo pra fora.
一 A medida que crescíamos, Hades parecia mais focado em prosperar nossa vida profissional, alegando que não teríamos um bom legado se não nos esforçássemos corretamente 一 Prosseguiu o menor, sentindo o chá esfriar através da porcelana 一 Bia e eu vivemos com todas as regras na cabeça, sem ter ideia de como incrementá-las.
O alfa não parecia muito confortável com o óbvio rumo disso, mas permaneceu centrado no que Nico dizia.
一 Então, na escola, eu comecei a gostar de um cara mais velho, duas turmas acima da minha 一 Confessou, pouco a vontade com o assunto 一 Meu pai não gostou nada. Mas minha mãe só apoiou. No fim das contas, papai revelou tudo ao dito-cujo, que nunca mais olhou na minha cara senão pra me zoar.
一 Nico, eu...
一 Depois desse incidente... 一 Continuou o moreno, interrompendo seja lá o que Will estava prestes a dizer. Não fora fácil ter que trazer a tona uma ex-paixão pra alguém a quem verdadeiramente ama, não aguentaria ouvi-lo comentar sobre isso 一 ...seguiu-se a descoberta do meu gênero secundário. Bia tirou ômega também, mas, pra ela, era o esperado por ser uma garota. Já eu...
Solace quis abraçá-lo. Dizer que isso não importava, mas ele próprio sabia que ter o apoio dos pais era essencial nessa fase complicada.
一 Hades me tolerou durante um tempo 一 Prosseguiu, a voz embargando e as lágrimas se formando em seu olhar 一 Bom, até ele ter a ideia brilhante de me expulsar, sem mais nem menos. Ele chutou de casa, sem nada. Meu único recurso foi ir para a escola, onde eu encontraria a pessoa que me ajudaria, sem impedimentos do meu pai.
O loiro sabia que ele estava falando de Jason. Agradecia aos deuses por tê-lo ajudado.
一 Ele me acolheu 一 Fungou, já chorando 一 Me deu um lar sem nem pensar duas vezes. E eu não sei o que teria feito e nem onde estaria agora sem ele. Jason me salvou. Não por piedade ou obrigação, apenas porque quis.
一 Porque ele te ama 一 Disse Will, passando o dedo por suas lágrimas, desfazendo o rastro que tinham traçado por seu rosto 一 Jason fez o que fez simplesmente por te amar e te querer bem. Ninguém que te ama de verdade vai te deixar nos seus momentos mais difíceis, Nico. Sua mãe não fez isso, Bianca não fez isso, Jason jamais faria, Piper não faria isso nem de graça, Leo não fez isso e eu também não vou.
Nico não tinha palavras pra agradecer. No seu peito dolorido, uma faísca de esperança se acendeu. Uma centelha de amor. Tudo o que sentia era o mesmo que todas as pessoas citadas por Andrew fizeram com que se sentisse: Grato. Grato pelo simples fato de terem lhe aceitado do jeitinho que é. Grato por estarem ali, de alguma forma.
一 Will, eu não... 一 Engasgou-se com o choro, começando a soluçar compulsivamente.
O loiro o puxou para perto e apertou o menor em seus braços. Deixou que chorasse o tanto que conseguia, colocar pra fora toda dor.
一 Eu sei, eu sei 一 Sussurrou ao pé do seu ouvido 一 Eu estou aqui. Eu estou aqui por você e apenas pra você. Sempre...
E, ali naquele abraço, Nico se sentiu acolhido. Não importava o quanto doesse, não importava o tamanho da culpa, ele tinha Will com ele. Nico tinha sua irmã, seu primo, seus amigos. Não estaria sozinho no fim das contas. Ele tem uma família. E sua mãe sempre, sempre faria parte dela.
C O N T I N U A
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