No primeiro ano do ensino médio, descobri uma coisa crucial sobre mim que eu jamais imaginava. O quê? Eu sou arromântico e assexual. Como? Bem... Aí já é mais complicado.
Lá pelo finalzinho do nono ano, Frank e eu fizemos duas amizades peculiares: Leo Valdez e Piper McLean. Acho que eles surgiram em nossas vidas para nos dar um gostinho de coisas as quais nunca estivemos interessados em experimentar. Por exemplo: romance e um rótulo para sua orientação sexual.
Um belo dia...
— Will, sabia que a Drew gosta de você? — Leo sentou do meu lado na hora do almoço.
— Legal. O que que tem?
Piper e Leo trocaram olhares.
— Você gosta dela? — Piper pergunta.
— Estamos falando da mesma Drew?
— Só tem uma Drew na nossa sala, Will — Diz Frank ao revirar os olhos.
— Então não. Não gosto dela.
— Por quê? — Pipes parece indignada.
— Porque ela grita, faz escândalo e só sabe falar dela mesma. Não é nada interessante.
— Ela é minha irmã! — Protesta, indignada.
— Não vou retirar o que disse só porque ela é sua irmã, Piper.
Leo me encara, pensativo.
— A gente tá falando do mesmo tipo de gostar?
Bufo, mordendo meu sanduíche.
— De que tipo de gostar vocês estão falando?
— Gostar romântico. — Frank esclarece. — Eles tão dizendo que a Drew é apaixonada por você.
Minha mente fica em branco. Confuso, encaro a mesa. "Gostar romântico" não é um conceito com o qual estou acostumado.
— Will... — Leo chama. Olho pra ele. — Você já se apaixonou? Já gostou de alguém antes?
Balanço a cabeça, devagar.
— Já sentiu atração por alguém? — Pipes pergunta.
— Atração...?
Leo e Pipes trocam outro olhar significativo, mas não dizem mais nada.
Chegando em casa, fiz pesquisas, testes, vi vídeos sobre e me descobri parte do espectro aroace. Passei uma semana refletindo a respeito, percebendo sinais em meu passado de que sempre fui assim. Eu sempre fui assexual e arromântico. Eu sempre fui eu mesmo.
Quando pensei em contar para os meus pais, quase dei de ombros e deixei pra lá. Não por que eu estava com medo da reação deles ou algo assim, mas porque eles provavelmente já sabiam. Eles são meus pais. Devem ter percebido os sinais antes de mim. Decidi contar mesmo assim.
— Pai, mãe. Tenho algo a dizer.
— Então diga, Will. — Respondeu Annie, observando Percy lavar a louça.
— Respire fundo e desembuche, filhote. — Esse foi o incentivo que Percy me deu, parando pra ouvir.
— Eu sou arromântico e assexual.
Como o esperado, eles trocam um longo e significativo olhar. Parecem ter uma conversa silenciosa. Quando Annie suspira, sei que eles decidiram o que fazer.
— Nós já sabíamos.
— Eu sei.
— Como?
— Tava tão na cara. Eu fui lerdo por não ter me dado conta antes. — Supiro. — Como souberam?
— Quando você começou a sofrer bullying, pesquisamos pelo seu psicólogo e desabafamos no Reddit sobre seu zero interesse em romance e em relações sexuais. — Percy diz.
— Desde cedo, zero interesse ou entendimento em amor romântico. — Annie continua. — Nos disseram que você podia fazer parte do espectro aroace. Deixamos você descobrir sozinho.
— E vocês tão de boa com isso?
— Will, você sabia que a mãe adotiva da Annie é assexual? — Confidencia Percy.
— A vó Thalia?
Ele assentem.
— Estamos super de boa, filhote.
Abraço os dois, feliz demais pra não fazer isso. Nico estava no sofá, mas mia e vem até nós ronronando. Ele me escala e se esfrega em meu rosto. Pego-o no coloco e deixo um beijo estalado em sua cabeça. Há uma satisfação muito grande em meu coração desde aquele dia. Uma alegria imensurável.
Depois de me assumir para os meus pais, me assumi para os meus amigos. Eles foram tão tranquilos com isso quanto Annie e Per. Foi divertido. Eu tinha feito uma festa do pijama pra criar um clima legal e Nico estava sempre comigo pra me dar apoio e confiança.
— Bem., tava realmente na cara. — Pipes disse.
— Não se sinta lerdo por isso. — Leo se espreguiçou. — Eu tava faltando morrer de amor pelo Frank e nem sabia que sou bi.
O Zhang corou.
— Às vezes faz tão parte da gente que não percebemos. É normal. — Disse ele.
— Pois é. — Piper apoiou. — Eu demorei meses refletindo pra chegar na conclusão de que sou lésbica. É tão natural que pensar que somos diferentes dá um nó no cérebro.
Me volto para Frank.
— Você se identifica como?
— Eu sou demipansexual.
Assinto. Lembro de ler sobre durante as minhas pesquisas. É aí que esse assunto parece se encerrar e outro tópico surge.
— Qual profissão vocês querem ter? — Piper pergunta, pegando um pouco de pipoca.
— Eu quero ser engenheiro mecânico. Quero ser doutor em engenharia mecânica.
— Uau. Isso é bem ambicioso. — Frank sorri.
Ele quase nunca sorri e Leo cora. Fico com a sensação de que a conversa sobre sexualidade mostrou uma possibilidade a eles.
— Quero ser veterinário. — Respondo, acariciando Nico, que segue deitado em mim.
— Quero ser policial. — Diz Zhang. — Meu pai era um soldado do Exército. Minha mãe era policial civil. Meu avô materno era general. Quero seguir essa linha também.
— Isso é admirável. Muito corajoso. — Valdez diz.
— É uma escolha muito significativa. — Digo.
— Sua mãe ficaria orgulhosa. — Pipes diz.
— Obrigado, pessoal. — Ele parece prestes a chorar. — E você, Piper?
— Quero ser estilista. Ou então designer.
Olho para nosso pequeno grupinho. Todos bem resolvidos, com sonhos a seguir e metas definidas para o futuro. É nesse momento que algo me ocorre. Eventualmente vamo todos morrer. Não há garantia de que continuaremos amigos quando adultos.
Nico lambe meus dedos quando começo a sentir o choro vindo. Ele me encara profundamente, preocupado e transbordando de amor por mim. Acaricio-o lentamente. Ele ronrona e sei que está tudo bem. Ele sabe e está disposto a tudo até lá. Eu também estou.
— Eu amo vocês. — Digo aos meus amigos pela primeira vez. — E prometo manter contato.
— Oh, Will... — Piper chora.
E o grupo se abraça. Pra sempre.
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